Admiração versus fanatismo

Há muito tempo que andava com vontade de escrever sobre este tema, mas a falta de tempo e a preguiça foram-se sobrepondo sempre à vontade de escrever. De modo que, quase depois de um ano sobre o início deste cantinho na blogosfera, finalmente decidi escrever sobre um tema controverso, que tem sempre várias perspectivas.
Basta olhar para o blogue, para as etiquetas, para perceber quais os meus gostos musicais e literários, de entre os quais se destacam principalmente Xutos & Pontapés e Jorge Palma, que desde há alguns anos a esta parte me fazem percorrer muitos quilómetros pelos caminhos deste cantinho à beira mar plantado. Há também lugar para outros, como Mafalda Veiga, Sérgio Godinho e Luís Represas... e outros mais. Aliás, desde há muito tempo decidi investir bastante do meu tempo (e dinheiro), em prol dos meus livros e dos meus discos... e dos meus concertos. Gosto de música- desde miúda que estudava ao som de música, fosse de rádio fosse de k7s "piratas" que os amigos me iam gravando, nos tempos em que o dinheiro não abundava... e tive a sorte de ao longo da minha vida encontrar uma série de gente com gostos musicais "exquisitos", e com uma grande colecção de discos, que me ajudaram a conhecer a obra de uma série de gente, que hoje faz parte da minha colecção de discos... a minha educação musical deveu-se em grande parte a eles...

Em miúda (10-12 anos) houve duas bandas que me marcaram e ao som das quais cresci: Trovante e Queen. Uns anos depois, já adolescente, um colega gravou-me o "Cerco" dos Xutos... e o tema "Barcos Gregos" tornou-se quase um lema para a minha vida... e a dificuldade em encontrar emprego em Portugal durante 15 anos, e as "ofertas" e melhores perspectivas que se iam deparando do exterior, realmente deram-me razão quanto a essa escolha... e creio que se não fosse pelo meu pequenote e pelos problemas de saúde dos últimos anos, teria partido "pra longe, pra muito longe"... mas decidi ficar, porque "ele há coisas a acabar, mas há tantas a começar..."

Ao longo dos últimos anos encontrei algumas pessoas que partilhavam os mesmos gostos musicais que eu: Xutos, com o #xutos, há cerca de 5 (ou 6???) anos (datas não é o meu forte!!, especialmente quando não há uma referência de nota) e posteriormente o site oficial; Jorge Palma, na página marginal; Mafalda Veiga... e embora, em relação à Mafalda Veiga, sempre me tenha sentido bastante "acarinhada", como admiradora, e tenha uma excelente impressão dela, mantida e alimentada ao longo de alguns anos de concertos (basta ver a forma como dedica o trabalho-concertos e discos- às pessoas que colaboram com ela de alguma forma ou aos fãs, com quem tem uma relação de (quase) intimidade), em relação aos Xutos ou em relação ao Jorge Palma, os fãs às vezes apresentam algumas reclamações em relação aos concertos. Ou seja, existe uma relação de grande admiração pelo seu cantor ou pela sua banda, e apenas assim se justifica que embora reclamando, se apresentem no concerto seguinte, às vezes com as mesmas reclamações no final, ou piores... mas quando ao invés são surpreendidos com um concerto fabuloso, esquecem tudo e mostram um grande sorriso de "alma cheia". É por isso que eu gosto destes fãs: reconhecem as limitações dos seus ídolos e são extremamente críticos, porque sabem que dali podia vir algo melhor... mas quando são premiados com um bom concerto, são os primeiros a manifestarem-se e a agradecer. E para além disso, nunca senti que houvesse uma grande luta por mostrarem que são os maiores fãs dos Xutos ou do Jorge Palma- e sempre houve uma enorme disponibilidade e uma grande partilha de fotos, ficheiros, notícias... E especialmente da parte dos Xutos (e por vezes da parte do Jorge Palma também), (especialmente) nos últimos tempos existe uma preocupação em saber o que pensam os fãs sobre os concertos, e um certo cuidado relativamente às reclamações... o facto de haver esta "aproximação", aumenta a admiração... mas creio que, o fanatismo é evidente apenas nas pessoas que vão a um concerto esporádico, que se descabelam por uma palheta "lambida" ou uma bakete, e fazem figurinhas histéricas que são verdadeiras anedotas, e com as quais me (nos) farto(amos) de rir... :-)))

Nestes últimos 5 anos encontrei imensas pessoas de entre os "andarilhos" e os "palmaníacos" (e muitos dos andarilhos seguem Palma também... embora o contrário seja bem mais raro!!), que rapidamente encontraram um canto especial no meu "batente malandro"... o reencontrá-los faz-me ir aos concertos com um sorriso, sabendo que vou encontrar (mesmo sem esperar) algumas pessoas conhecidas e de quem gosto...

Nos últimos tempos, alguns dos meus livros de cabeceira, que devorei, foram "Freddie Mercury: Auto-retrato" e "Não sou o único: A biografia do Zé Pedro, guitarrista dos Xutos & Pontapés (escrita pela sua irmã)". Em ambos os livros, existe sempre uma referência aos fãs e à importância dos fãs na vida artística de ambos.

"Com o tempo, se mantivermos o êxito, vamos ouvindo comentários de pessoas que connosco cresceram. (...)
O que ando agora a fazer é o que mais me interessa e estou muito feliz por as pessoas comprarem os meus discos e por gostarem de mim. (....) Se estiver feliz, isso manifesta-se no meu trabalho. (...)" (Freddie Mercury)

"O Zé Pedro é igual aos outros fãs! Igual aos fãs dos Xutos! Porta-se tal e qual como eles, com máquina fotográfica e tudo. Acho que ele te muitapaciência com os fãs dos Xutos e deve ser porque os entende muito bem. Tem uma postura muito simples." (palavras da Marta Ferreira, que o conhecia tão bem... e sim, já vi o Zé sair de um concerto dos Stones de máquina com um grande sorriso-tal como eu muitas vezes depois de um concerto dos Xutos... e quando viu caras conhecidas, cumprimentou-nos com um grande sorriso... um sorriso genuíno, sem ser daqueles estereotipados... ).

E ambos- Zé Pedro e Freddie Mercury- sempre souberam e tiveram plena consciência que a vida que gostavam se devia aos fãs- as pessoas que compravam os discos e assistiam a concertos... aliás, e no caso específico dos Xutos, ao longo desta tournée, uma boa parte do alinhamento foi votado pelos fãs, em Peniche, no início de Junho alteraram o alinhamento e os fãs (entre os quais, eu, que reclamo que me farto) reclamaram... e no concerto seguinte, mesmo sem grande vontade, dado que Alvaiázere foi 6 dias depois da morte da Marta, o alinhamento foi alterado... isto e o facto de terem feito um concerto "íntimo", para os fãs, em Março, foi uma forma de agradecer aos fãs e mostrar-lhes que são importantes. É curioso, que depois há outros que deveriam ter um comportamento idêntico, porque se levam 25 ou 30 anos de carreira, o devem às pessoas que vão aos concertos e compram os discos, mas volta e meia, em entrevistas se referem ao contacto com os fãs como "uma seca", ou uma forma de perderem tempo... enfim, esses são os grandes artistas da nossa praça, os intocáveis (e há vários!!!)... mas a sensação com que fico sempre depois dos concertos é: ok, foi porreiro, mas... vou para casa, que ter um autógrafo de alguém tão senhor do seu nariz, que cumprimenta os fãs com um sorriso estereotipado, não é para mim (até porque eu gosto de sorrisos genuínos)...

Pena é que tantas vezes a admiração se transforme em fanatismo- quando o mundo gira apenas em torno do nosso ídolo e não existe mais nada, nem nos preocupamos em conhecer mais nada, que não esteja directamente ligado ao nosso ídolo... como dizia a Xein, com muita razão, muitas vezes (de)cai-se de fã (admirador) em FANático... infelizmente é assim. Felizmente, os andarilhos e os palmaníacos (no geral... conheço poucas excepções, felizmente!!!) são diferentes e bastante críticos (com críticas construtivas)... e é por isso que eu gosto de vocês!!! E o facto de os nossos ídolos até irem atendendo os nossos "pedidos" só demonstra que merecem todo o nosso respeito... é pena que outros vejam as críticas como armas de destruição maciça. Mas cada um tem os fãs que merece...