13 março 2010

...qualquer dia estarei a amar criaturas azuis em vez de desejar a aspereza do Clint...


Um equilíbrio de forças

Escrevo esta crónica no dia em que se conheceram os vencedores dos Óscares – a cerimónia que estranhamente não faz companhia aos padeiros e que mais pipocas fará vender nos próximos meses. Eu não vi, mas quando acordei senti um secreto orgulhozinho na vitória de Kathryn Bigellow, especialmente por aquilo que já todos sabem, o facto de ter sido casada com James Cameron.

Cameron tem ar de banana. Tem, tem! É chato dizer isto de um tipo que fez que milhões em todo o mundo fossem ao cinema ver criaturas azuis. Na Avenida dos Aliados, uma vez por ano, também costumava haver gente pintada de azul. Infelizmente parece que este ano não há…

Voltemos a Cameron: quando soube que Bigellow tinha sido casada com ele, dei por mim a pensar na quantidade de mulheres fortes (ou aparentemente fortes) que são casadas ou vivem com tipos com ar de totós. Tipos que vacilam (embora quase todos os homens vacilem), tipos que mesmo encostados à parede ainda dizem: «talvez», «não sei», «e tu o que achas?». Cameron se calhar até foi o melhor homem que ela alguma vez teve, mas isso não lhe retira o ar pachorrento e domado. Deve ter sido na altura de Bigellow que Cameron pôs Di Caprio a dizer: «I’m the king of the world!»…


Porque é que mulheres destas precisam de homens vulneráveis é um mistério. E talvez contra mim fale, contra mim e contra todas vocês que arranjaram um Cameron man.
Porque é que um tipo, um cowboy Marlboro, não pode ser o equilíbrio de uma Jodie Foster? Jodie Foster não foi um bom exemplo… Manuela Ferreira Leite? Também não… Pensem numa empresária nortenha de sucesso, daquelas que fazem o mundo e a fábrica avançar. São mulheres que acordam antes deles, que põem a cozinha e a família a mexer, que compram lingerie e sofrem na depilação. Agora espreitem o marido delas. Normalmente é um Cameron.

Na vida de um par não há lugar para dois fortes? Um tem sempre de anular o outro? Um tem de permanecer neutro para que o outro brilhe?
Então o amor é injusto, não?

Reparem no caso de Kathryn Bigellow e de James Cameron: mesmo separados, só um deles teve direito à vitória. Não é injusta esta energia que pende sempre para um dos lados?
Pensemos no cowboy Marlboro (gostei de me lembrar dele…), o homem de rugas sulcadas no rosto, hálito de papel, cabelo sem brilho, olhos na sombra… este duro não pode amar uma das amazonas? Tem de socorrer a mulher de ar frágil que busca protecção nos seus ombros e falsamente desmaia? Mas que leis piedosas regem afinal o amor?

Bigellow, a mulher para que todos olham agora questionando-lhe a aparência (boa!), a idade (enxuta!) e o talento (inquestionável), o que terá visto em Cameron quando se enamoraram? Serão as mulheres aparentemente fortes muito mais frágeis do que aquelas que não se dão ao trabalho de fingir? Por essa ordem de ideias, Cameron seria muito mais valente que Clint Eastwood…

O amor é este aborrecido equilíbrio de forças. Fugimos dos sarilhos como do dente à broca. Lembro-me que da única vez em que me liguei a um rapaz sedutor e bem falante me dei mal. Perdi o norte, a lucidez, a razão. Envergonhei os meus amigos que me julgavam forte em todas as circunstâncias. Fraquejei nos braços de um bom vendedor de banha da cobra. Tão bom quanto eu.
Ou seja, Bigellow é que estava certa. (Eu já vejo no futuro um James Cameron à minha espera com uma camisola poveira e um São Bernardo na mão…)

Nós não queremos que o amor nos deixe em estado de guerra. Precisamos de pacificar o coração com gente que seja o outro lado da moeda.
Uma seca de facto.


Qualquer dia estarei a amar criaturas azuis em vez de desejar a aspereza do Clint.

Oh God, make me good, but not yet!

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