21 maio 2015

...morremos todos os dias...



A morte é uma armadilha. Por vontade dela estaria presente em cada momento de cada um dos nossos dias.


Até ontem eu pensava que o tempo imenso que gastamos a prepararmo-nos para a vida era uma perda de tempo. O tempo de nos lavarmos, vestirmos e transportar-nos (diariamente repetido e expandido ao longo do nosso sempre tragicamente pouco tempo de vida) não é afinal um desperdício perante a morte.


É uma prova e uma afirmação de vida. Perder tempo é a melhor prova de se estar vivo. Desperdiçar o que se tem (incluindo o tempo) é um sinal seguro de se ser, afinal, rico.


Pensar na morte é a melhor maneira de dar valor à vida. O tempo que perdemos a fazer coisas (como mijar) que não são prazeres nem nos ensinam nada é, qualquer que seja a nossa opinião sobre os defeitos da existência, um terrível desperdício.


O melhor, para dar valor à vida, é fingir e imaginar que se morre odos os dias. É fácil. Estarmos cá, vivos e conscientes, é uma estranha excepção, que vai a favor de todos os que morreram e que nunca mais voltaram.


Sabe bem, para quem também tem, humanamente, queda para a tristeza, saber que é pouco o tempo que cá passamos. Comparado, sobretudo, com aquele que doidamente imaginámos cá ficar.


Morrer é deixar de ter responsabilidades. É o contrário da rotina. Na morte deixa de haver desperdício de tempo. Só a decadência e a degradação do corpo - ridiculamente - subsistem.


Ainda bem que assim é, para quem ainda continua a viver.

Sem comentários: