... corpo é a sombra de minha alma...
De repente as coisas não precisam mais fazer sentido. Satisfaço-me em ser.
Tu és?
Tenho certeza que sim.
O não sentido das coisas me faz ter um sorriso de complacência.
De certo tudo deve estar sendo o que é.
Hoje está um dia de nada. Hoje é zero hora.
Existe por acaso um número que não é nada? que é menos que zero?
que começa no que nunca começou porque sempre era? e era antes de sempre?
Ligo-me a esta ausência vital e rejuvenesço-me todo, ao mesmo tempo contido e total.
Redondo sem início e sem fim, eu sou o ponto antes do zero e do ponto final.
Do zero ao infinito vou caminhando sem parar. Mas ao mesmo tempo tudo é tão fugaz.
Eu sempre fui e imediatamente não era mais.
O dia corre lá fora à toa e há abismos de silêncio em mim.
A sombra de minha alma é o corpo. O corpo é a sombra de minha alma.
A sombra de minha alma é o corpo. O corpo é a sombra de minha alma.
Clarice Lispector
in «Um sopro de vida»
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