05 abril 2007

Como amar uma mulher (e sobreviver)

Esta é uma conversa só para homens. Minhas senho­ras, queridas leitoras, por favor saiam neste parágrafo e fechem a página. Saíram?

Será que saíram todas?


Estamos então entre nós. Bom, é que eu preciso de desabafar. Sou um homem que gosta de mulheres. Muita gente acha que não há nisto nada de extraor­dinário. Enganam-se: são poucos os homens que gos­tam de mulheres. É para estes, na verdade, que escrevo esta crónica. Os outros, os que pensam que gostam de mulheres - mas nunca entrançaram os cabelos do seu amor -, esses podem também fechar a página.

Agora, sim, estamos entre nós. Dizia eu que gosto de mulheres. O problema é que, por vezes, sinto uma enorme dificuldade em tolerar certas manifestações da natureza feminina. Por exemplo a mania da ordem. Ordenar é sempre uma violência. Nós, homens, res­peitamos as obscuras leis da física. Sabemos que o Uni­verso caminha para o caos.
Contrariar o caos parece­-nos uma impiedade. Há uma lógica indomável na desordem natural que um escritório adquire ao fim de largos anos de intensivo uso masculino. Cada coisa no seu lugar incerto. Mostrem-me um escritório arrumado e eu mostrar-vos-ei um espírito desocupado. Mostrem­-me uma repartição impecavelmente limpa e ordenada e eu mostrar-vos-ei um dormidouro de apáticos e negli­gentes.

A paciente desorganização do universo, no entanto, não resiste à fúria arrumadora das mulheres. Um homem leva anos para transtornar convenientemente o seu local de trabalho. E então distrai-se, ou apai­xona-se (é a mesma coisa), permite que uma mulher aceda a esse lugar sagrado e em escassas horas ela vira­-o de pernas para o ar - isto é, arruma-o.

As mulheres não conseguem compreender porque é que guardamos as esferográficas dentro de um sapato velho. Nós também não compreendemos, mas - meu Deus! - sabemos que isso não é coisa para ser compreendida. É aquele o lugar das esferográficas, certo? Isso basta-nos.


Podia falar ainda da clássica guerra da tampa da sanita mas falta-me espaço. Não resisto no entanto a deixar aqui uma anedota feminista de circulação recente ­Pergunta: quantos homens são necessários para mudar um rolo de papel higiénico? Resposta: não se sabe, nunca aconteceu. Acredito. Durante muito tempo pen­sei que aquilo fosse um processo automático, sei lá, que eles se mudassem a si próprios. E pronto, desabafei.


Querem saber agora qual o segredo para amar uma mulher e sobreviver? Eu também.


José Eduardo Agualusa

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